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Os principais erros dos editais de concursos públicos

15/06/2014 20:59

 

De acordo com o Ministério Público Federal, 95% dos procedimentos relacionados às seleções se referem a editais
O edital é a lei que rege um concurso público. Por isso, ele deve ser lido com cuidados pelos candidatos. Apesar de ser elaborado como um guia para que os concurseiros orientem seus estudos, os documentos têm sido sinônimo de dor de cabeça para milhares de pessoas.
 
Em alguns casos, os editais são confusos e cheios de restrições e muitas vezes contém informações ambíguas, interpretadas conforme os interesses dos órgãos contratantes.
 
De acordo com o portal da transparência do Ministério Público Federal (MPF), 95% dos procedimentos extrajudiciais — ou seja, solucionados por meio de acordos — relacionados às seleções se referem a editais. Entre os processos judiciais (que vão a julgamento) e inquéritos policiais que tratam do tema, 83% são sobre o documento.
 
Os problemas entopem o MPF e os tribunais. Não à toa, uma série de jurisprudências já existe quando o assunto é certame público. Entre os principais questionamentos estão a falta de clareza, falhas na divulgação do cronograma e a cobrança, nas provas, de conteúdo não citado no edital.
 
Nesses casos, o subprocurador-geral da República Francisco Rodrigues, da 1ª Câmara de Coordenação e Revisão, explica que a atuação do MPF fica reduzida, à medida que se trata de uma questão de interpretação. "A clareza pode até não ser suficiente, mas muitas vezes não dá para culpar a banca porque é uma questão de nuances, que fazem com que as pessoas não consigam entender o que está sendo exigido", explica.
 
Única forma de contatar as bancas organizadoras, o recurso não costuma, porém, ser muito eficiente. As empresas, segundos os especialistas, se limitam a reforçar o que está no edital e se negam a flexibilizar qualquer norma. Além disso, há casos em que nem sequer elas respondem.
 
Segundo o Diretor Acadêmico do site Questões de Concursos, Fernando Bentes, os principais problemas relacionados a concursos públicos dizem respeito ao edital que é muito mal feito e elaborado sem uma visão pretérita sobre todos os problemas possíveis que pode causar. "Se as bancas e a Administração Pública tivessem um pouco mais de preparo técnico-jurídico, não haveria tanto problema", disse.
 
Os casos de contestação que mais se repetem são relativos à correção das questões; aos critérios de avaliação e desempate; ao rol de disciplinas previsto no edital; e à forma e ao prazo de recursos, conforme informações do diretor. Dependendo de qual seja o motivo da reclamação, segundo o especialista, é possível mudar o edital por ato próprio da organização do certame ou pela via judicial.
 
"Quanto maior o grau de violação de um princípio constitucional - legalidade, moralidade, igualdade, eficiência, impessoalidade - maior a chance de retificação editalícia", explicou.
 
Bentes destaca que muitas vezes a banca divulga duas respostas certas numa questão de múltipla escolha ou estabelece uma pergunta sem resposta correta ou até chegar ao cúmulo de cobrar uma resposta que é errada segundo a orientação de plúrimos livros e autores célebres. Isto, obviamente, gerará a nulidade da questão, com o redirecionamento dos pontos a todos os candidatos.
 
As cláusulas de avaliação e desempate são dúbias, pouco claras e mal redigidas, dando margem a interpretações diversas e causando insegurança nos candidatos.
 
"Quando o conteúdo cobrado pelo edital é amplo, isso deixa o candidato sem saber o que será cobrado, mas a banca fica confortável para exigir qualquer coisa na prova. Quando o edital é analítico, específico ou detalhista, não há fuga, a banca só pode cobrar o que está previsto e aí começam os problemas, porque chega-se ao absurdo de se cobrar conteúdo ausente do edital", avaliou.
 
Ele lembra que os prazos de recurso são muito exíguos, às vezes são presenciais e o candidato deve se deslocar até um local determinado, inviabilizando o exercício de seu direito de contestação. Sem contar que nem todos os concursos deixam a prova discursiva visível para que o candidato possa contestar os critérios de correção. O ideal seriam recursos pela internet, com visualização do gabarito da prova objetiva e consulta on line (escaneada) da prova discursiva, além de um prazo mínimo de 5 dias para interposição da peça recursal, o que garante uma pesquisa e consulta prévia do candidato a livros e professores.
 
Em grande parte, o projeto da lei geral dos concursos públicos deve regulamentar grande parte das questões que complicam o dia-a-dia dos candidatos. Mas enquanto o Congresso Federal não a aprova, cabe interpor recurso contra a banca/órgão público que promove o certame; denunciar ou representar ao MP, para que este averigue e intervenha para solução do problema; ou impetrar um mandado de segurança na Justiça, o mais rápido possível.
 
Segurança
 
Nos concursos para cargos de segurança pública, como voltados à contratação de policiais ou bombeiros, a situação é ainda mais complicada. O teste físico e a exigência de uma série de exames são sempre alvo de polêmica. Além disso, os fatores que determinam que um candidato é incapaz de exercer o cargo incluem até mesmo dentes cariados, segundo mostra o último edital para a PMDF ou teste de HIV para a Polícia Militar do Piauí.
 
As provas de esforço físico, geralmente, são questionadas pelas mulheres. Elas costumam ir à Justiça para conseguir o direito de fazer a barra com pegada livre e de forma estática, sem fazer flexões. Tanto o Ministério Público quanto o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já admitiram, em diversos casos, que as alterações fossem feitas ou, ainda, que o teste fosse suspenso.
 
Saiba mais
 
Manual da dor de cabeça
Feitos para ser um guia dos concursos, os editais são campeões de denúncias no Ministério Público Federal (MPF)
 
Queixas / As principais reclamações são:
 
* Falta de clareza na elaboração dos itens ou no cronograma e cobrança de conteúdo fora do edital Nesses casos, o melhor é tentar, primeiramente, esclarecer o ocorrido com a banca, por meio de recursos. Não é comum que o Ministério Público intervenha na interpretação do edital.
 
* Teste físico. No caso das mulheres, a polêmica é sempre grande. O MPF já chegou a acionar a Justiça para garantir, em concursos como o da Polícia Federal, que as candidatas ao cargo que não conseguiram fazer a barra pudessem repetir o exame com pegada livre e de forma estática, apenas se mantendo suspensa, sem fazer flexões.
 
* Questões relativas à reserva de vagas para pessoas com deficiência. 
Por lei, elas têm cotas nos certames. A reserva pode variar de 5% a 20%.
 
 
É considerada deficiência*, segundo a Lei nº 3.298/99:
 
» Física : alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física;
 
» Auditiva : perda bilateral, parcial ou total de 41 decibéis ou mais.
 
» Visual : casos em que a "acuidade visual" é inferior a 0,3 no melhor olho, com a melhor correção óptica, além daqueles nos quais a somatória da medida do campo visual em ambos os olhos for igual ou menor que 60 graus;
 
» Mental : fundamento intelectual significativamente inferior à média, com manifestação antes dos 18 anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas, como comunicação, cuidado pessoal e habilidades sociais.
 
*A surdez unilateral não é considerada deficiência pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), diferentemente dos que possuem visão monocular, que podem assumir como PNE.
 
Fontes: Editais, Lei nº 3.298/99, STJ, MPF 

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